FEIRA 191 ANOS: Cotó do Licuri - dignidade na luta pela vida
Nem sempre se pode ser doutor, político, artista de tevê, jogador de futebol e tantas outras profissões que garantem privilegiada condição financeira e prestígio, mas a dignidade pode estar presente no semblante mais simples e no cidadão mais humilde. Júlio Cruz do Espírito Santo, o ‘Cotó do Licuri’, é uma dessas pessoas que apesar da sua humildade engrandecem o cotidiano.
Feirense de São José (Maria Quitéria), desde menino encarou a vida trabalhando, mas cedo também teve que dar uma guinada inesperada. Aos 17 anos fabricando bombas (fogos de artifício) perdeu a mão esquerda. Como não podia parar, passou a tentar a sorte de diversas formas, sempre honestamente - faz questão de dizer -, até que passou a vender piabas, camarão e licuri.
Foi o mapa da mina, principalmente o licuri ou aricuri – uma espécie de coco miúdo, produzido por duas variedades de palmeiras. Fixou-se nessa atividade há cerca de 45 anos, não lembra com exatidão, mas garante que vende na feira livre da Estação "desde que ela era pequenininha”. Aos 80 anos de vida caminha para meio século nessa atividade e fala com certo orgulho quando perguntam seu nome: é Cotó do Licuri. O nome de registro, Júlio Cruz do Espírito Santo, só depois de uma boa prosa.
Casado com dona Maria das Dores, que é evangélica, e pai de oito filhos ‘metade já faleceu’, ele sai a pé da Rua Bertulina Carneiro - Sobradinho às 6 horas da manhã nos domingos para vender sua mercadoria na Estação Nova, e retorna às 18 horas, geralmente depois de ter vendido um saco de 50 litros e até mais, às vezes dois sacos. O mês de setembro é um dos melhores períodos de venda, explica. Tem fregueses certos que chegam constantemente.
O licuri tem inúmeras utilidades, seja transformado em óleo usado na cozinha ou para fazer bolos, doces, até mesmo para ser mastigado in natura, depois que é quebrado. E na cachaça, garante “o cidadão não fica bêbado”. O pequeno coco produz um óleo vegetal sem comparação, afirma. “Ele não faz mal a ninguém, podem usá-lo. É gordura saudável”, afirma convicto Júlio do Espírito Santo e uma cliente confirma: "é verdade, há muito tempo uso o óleo do licuri para cozinhar, sem receio”.
Vale lembrar a importância dessa palmeira e a sua riqueza quando utilizada no artesanato. Chapéus, sandálias, bolsas, tapetes, esteiras e muitos outros artigos são produzidos com as palhas. Artigos que são bem procurados por turistas. Até mesmo o pó que resulta da raspa da palha da palmeira é utilizado para fabricar bacias, brinquedos e muitos outros objetos. Independente do coco, tudo tem utilidade nessa espécie vegetal.
O “coquinho da palmeira” ou “coquinho da Bahia”, por ele adquirido vem da região de Jacobina onde estão os maiores licurizais nos municípios de: Serrolândia, Várzea do Poço, Várzea da Roça, Piritiba e Quixabeira. Devido a farta produção já houve uma indústria na região. Júlio do Espírito Santo, que prefere mesmo ser chamado “Cotó do Licuri”, revela que trabalha em todas as feiras livres da cidade “aqui na Estação Nova, no Sobradinho, no Tomba e na Cidade Nova, fora isso estou sempre no Centro de Abastecimento”.
Alegre e comunicativo ele não nega que gosta de um ‘goró’ (cachacinha), mas nunca durante o trabalho. Não é muito ligado a música, mas gosta de ouvir a Radio Sociedade de Feira “na hora do esporte" o que se justifica pela sua paixão: o Fluminense de Feira. "O Fluminense é o único time do mundo para mim, só torço pelo Fluminense", diz emocionado.
Esta reportagem faz parte da série de matérias especiais elaboradas pela Secretaria de Comunicação Social destacando personalidades feirenses, monumentos, órgãos e empresas que fazem parte da história do município. A iniciativa comemora o aniversário de 191 anos de emancipação político-administrativa de Feira de Santana, celebrado em 18 de setembro.
Por: Zadir Marques Porto