CÉLIA PIRES: TALENTOSA ARTISTA FEIRENSE QUE MARCOU COM A PINTURA INDIGENA

10/6/2025, 10:19 | Foto: Arquivo de Família
A coluna Feira em História, assinada pelo jornalista Zadir Marques Porto, traz fatos históricos e curiosos sobre a cidade

Desde criança, ela mostrou seu talento em rabiscos infantis que chamavam atenção. No Colégio Estadual, colecionava notas altas em Desenho. Do grafite para o óleo sobre tela, não demorou. Vieram as exposições e o merecido reconhecimento da crítica e dos aficionados pela pintura. Versátil, trabalhou com várias técnicas e materiais, mas foi pintando índios, em óleo sobre tela, que sua fase se tornou marcante.

A arte nasce com o artista ou o artista nasce com a arte? Tanto faz. O importante, na verdade, é o que ele faz no decorrer de sua existência, o que ele produz. E, nesse aspecto, a feirense Célia Pires deu forte contribuição no segmento das artes plásticas, deixando para a posteridade não apenas quadros, mas a certeza de que teve uma vida extremamente útil para a comunidade. Filha de João Augusto Pires e Dona Mara Pires — ele, destacado comerciante local, proprietário da lembrada Loja Pires —, Célia começou muito cedo a demonstrar seu talento.

Aliás, não poderia, ou não deveria, ser diferente. De uma família de 13 irmãos — poetas, escritores, oradores e uma segunda colocada no concurso Miss Bahia, evidenciando a presença de intelectualidade e beleza na família —, a menina Célia começou a chamar atenção muito cedo. Mal passando dos nove anos, em meio a bonecas e o carinho da família, era só ter nas mãos um pedaço de papel para pegar um lápis ou uma caneta e começar seus rabiscos.

Casas, flores, animais, pessoas. Os traços ainda sem formas precisas, mas perfeitamente lógicos e compreensíveis, antecipavam o talento que estava a emergir. Aos 12 anos, as aulas de Desenho da professora Teresinha Gusmão, no Colégio Estadual, passaram a ser sua prioridade, embora não se descuidasse das demais disciplinas. As notas excelentes que obtinha, cravadas nas cadernetas pela mestra, eram provas irrefutáveis de sua capacidade em lidar com linhas, contornos, sombreados e outros detalhes próprios do desenho.

Mas logo a sensibilidade a fez ingressar no mundo do clássico. Manet, Michelangelo, Da Vinci, Renoir, Rembrandt passaram a ser olhados com extrema admiração e de tal forma inspiradora que logo pincéis, tintas e telas passaram a ter lugar comum em seu dia a dia. Em 1976, aposentou de vez o grafite ao trabalhar pela primeira vez uma série de obras na técnica óleo sobre tela. Os comentários de amigos e de artistas experientes foram animadores: estava surgindo uma nova estrela das artes plásticas na cidade.

Em 1979, três anos depois, estreava na coletiva "Arte Total", promovida pelo jornalista, escritor, advogado e conhecido cordelista Franklin Machado no Centro Cultural Amélio Amorim. Tímida e ainda temerosa de possíveis críticas negativas, recebeu feliz os comentários do público e de outros artistas que prestigiaram a mostra. "Arte Sem Passaporte", exposição realizada em 1985 no Hotel Meridian, Salvador, mostrou uma das mais significativas fases da artista feirense, quando ela se dedicou a retratar o índio como brasileiro nato. A perfeição da anatomia, as cores intensas e perfeitamente associadas nas vestes indígenas, a flora e a fauna expostas nas telas, causaram profunda admiração e o reconhecimento da crítica especializada.

Em 1989, os índios pintados por Célia Pires voltaram a fazer sucesso no Segundo Salão Baiano de Arte realizado em Salvador, no Solar do Unhão. Em várias outras mostras, a presença da obra pictórica de Célia Pires foi marcante, como em "Memória do Presente – Homenagem a Carlo Barbosa". Em 1996, Célia Pires idealizou e foi linha de frente na realização da mostra "Arte na Avenida", que durante bom tempo reuniu experientes e jovens artistas na Avenida Getúlio Vargas, em uma das mais comentadas iniciativas artísticas da cidade. Ao lado disso, ela promoveu várias oficinas de arte em colégios locais, propiciando o incremento da arte e o surgimento de novos valores.

Célia Pires participou de mais de 70 exposições em Feira de Santana, Salvador e outras cidades. Além disso, muitos trabalhos seus, especialmente telas da fase "índios", estão com colecionadores do exterior, principalmente na Espanha. Apesar da forma intensa como viveu a arte, ela nunca a teve como uma profissão, por entender a falta de formação cultural de parte da população. Mas dizia-se feliz com o que fazia, por ser a arte um dom divino e exercitá-lo trazia-lhe satisfação pessoal, trabalhando com técnicas variadas como óleo sobre tela, acrílica, vitrais e artesanato em pano. Apesar disso, a figura do indígena brasileiro sempre esteve presente nas diversas fases de seu trabalho, algo relacionado com o fato de sua ligação com a doutrina espírita, através da qual teve um trabalho social destacado que não gostava de comentar. A artista deixou a vida material em 6 de junho de 2021.

Por Zadir Marques Porto



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