FEIRA EM HISTÓRIA: Oscar Erudilho, um símbolo da Micareta
Com todas as atenções da cidade já voltadas para mais uma micareta – sua maior festa popular, vale a pena lembrar artigo do falecido historiador Hugo Navarro, sobre a trajetória de Oscar Erudilho, considerado pelo cronista da Folha do Norte e por todos que o conheceram como “um dos mais importantes incentivadores e participantes da nossa grande festa de que é verdadeiro símbolo”. (Adilson Simas)
Foto: Historiador Hugo Navarro
- Oscar Erudilho da Silva Lima era filho do Major Juvêncio Erudilho da Silva Lima, prócer da “Soc. Filarmônica 25 de Março”, conselheiro municipal e destacado membro da comunidade, dono de chácara na rua que hoje tem o seu nome e vai da Barroquinha ao alto do Cruzeiro, antigamente simples vereda, local de aprazíveis e bucólicas caminhadas da gente da cidade. Ali, Oscar, ainda garoto, perdeu olho, atingido por inseto, o que o obrigou a usar artefato de vidro durante o resto da vida.
Ainda jovem Oscar mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se tornou figura conhecida como nadador e ponta esquerda das divisões de base do C.R. do Flamengo e chegou a ser propagandista da cerveja “Cascatinha”.
De volta a Feira, deram-lhe o cargo de escrivão. Naquele tempo os processos eram manuscritos e Oscar tinha letra cheia de arabescos e enfeites, aprendidos certamente no Paleógrafo, que lhe dificultavam o entendimento. Na época, réus pobres eram defendidos, no Júri, por pessoas da comunidade, como Arnold Silva, Álvaro Silva Lima (Ioiô de Calú) e Áureo Filho.
Certa ocasião o Juiz, Joaquim Ferreira Coelho, entregou processo ao professor Áureo Filho para uma defesa. Áureo se esforçou para ler os depoimentos. Não conseguiu. Chamado, Oscar, depois de folhear os autos perguntou que diabo era aquilo. Teve que permutar o cargo com Gerolina Nunes Falcão, funcionária do Município.
Viu-se, de repente, transformado em tesoureiro da Prefeitura onde fez longa carreira como tesoureiro e secretário, espécie de imagem do governo municipal como homem da confiança de vários prefeitos, que representava em solenidades de toda ordem.
Não havia Semana da Pátria, enterro, inauguração ou Dia da Árvore onde não se encontrasse Oscar, gordo, roupa de linho branco, óculos escuros, sempre pronto para discurso e reclamando do calor (foi orador oficial da “25 de Março”). Discursava bem, na época em que se dava valor a esse tipo de habilidade.
Com o passar do tempo Oscar assenhoreou-se dos serviços municipais e de seus mecanismos, tornando-se indispensável a vários prefeitos que nada queriam com a administração, dando, a todos, ouvidos e explicações. Ao serviço nunca faltou e jamais chegou atrasado, pouco importando a farra da véspera.
Boêmio inveterado, autor de tiradas lembradas até hoje, quando certo prefeito, caçado por credores raivosos, ausentou-se da cidade (passou a residir em Salvador), Oscar portou-se heroicamente atendendo funcionários que lhe pediam o valor de “vales” e comerciantes a cobrar débitos diversos, puxando fumaça de cachimbo e explicando: meu querido (todo mundo para ele era “meu querido”) nem um tostão! Inventara maneira sucinta, mas definitiva, de dizer que o erário estava quebrado.
Vivendo no seio de sociedade fechada, preconceituosa, em grande parte hipócrita, a varrer defeitos e vícios para debaixo do tapete, como era a nossa, Oscar Erudilho resistiu o suficiente para farrear com representantes de várias gerações.
Morava na Rua da Aurora e durante algum tempo foi a mais importante figura daquele local. Sua casa ficava aberta durante todo o dia, frequentada por seus amigos, que podiam beber e comer, livremente, obedecendo apenas a uma proibição: ninguém ali poderia levar mulher para intimidades avançadas, prerrogativa apenas do dono da casa.
Oscar jactava-se de haver dançado, na inauguração do “Casino Irajá”, com bailarina que participou do show da festa. Era figura obrigatória na inauguração de todos os bares da cidade, não dispensava peru assado, com farofa e feijoada de feijão preto, aos domingos, e não faltava, com luzido séquito, às famosas matinées (que ocorriam nas tardes domingueiras) na “Euterpe Feirense”.
Agora, quando a Micareta volta a ser o assunto preferido da cidade, é justo relembrar Oscar Erudilho, um dos mais importantes incentivadores e participantes da nossa grande festa de que é verdadeiro símbolo.