A Feira Livre, a Festa de Santana e a Igreja Senhor dos Passos, nas memórias de Olga Magalhães
Professora aposentada, historiadora, declamadora, a feirense Olga Noêmia Magalhães, filha do ilustre professor e médico Gastão Guimarães, com o texto “Memórias de uma feirense”, viaja no tempo narrando três assuntos que integram a vida da cidade: a Festa de Santana, a Feira-Livre e a Igreja Senhor dos Passos. Vale a pena ler de novo (Adilson Simas)
Memórias de uma feirense
Olga Noêmia Magalhães
Para falar dos festejos de N.S. Santana, começarei pelo “Pregão”, que era o ponto de partida para a festa, e constava de um obelisco feito de madeira com a Imagem de Santana. (Existem lugares que têm a mesma tradição com o nome de mastro). Hoje existe um obelisco do lado esquerdo da igreja, substituindo aquele que era feito anualmente.
Nesse dia havia matina com muitos fogos e alguns mascarados pela rua. O passo seguinte era no próximo domingo, a saída do Bando Anunciador que, ultimamente a UEFS está ressuscitando. Então vinha o novenário, após o que vinham as famosas retretas, lavagem da igreja, levagem da lenha, Missa Festiva no domingo, após a última novena, e a Procissão de encerramento na quarta-feira, oportunidade em que eram anunciados os membros da comissão que deveria organizar os festejos para o ano seguinte.
A Feira-Livre
A feira-livre, a qual ostentou, por muitos anos, o título de maior feira-livre do Brasil. Ela nasceu há mais de trezentos anos, de maneira totalmente espontânea, pois com a construção da capela de Santana e São Domingos, começou o local a servir de ponto de descanso de boiadeiros e tropeiros e, logicamente, pelo ajuntamento de pessoas, nasceu o mercado de trocas e vendas, e, seguindo assim, como uma bola de neve: o progresso exigindo progresso. Tudo como aconteceu na Europa quando o feudalismo deu lugar ao capitalismo.
A feira-livre de Feira de Santana que nascera em terras de terceiros, cresceu e com a construção de casas comerciais tomou a direção mais plana, que era o norte da Capela se fixando no centro da povoação, onde, em 1914, com o enorme crescimento da feira-livre, foi construído o Mercado Municipal.
A feira-livre de Feira de Santana foi a maior e melhor do Brasil até a construção do Centro de Abastecimento (também conhecido como Centro de Aborrecimento). Mas vamos dar um passeio pela feira-livre antiga: na década de 30 existia uma organização na acomodação das diversas mercadorias, cuja organização nasceu junto com a feira:
A partir da margem da Avenida Senhor dos Passos, começava com o local de artesanato de obras de barro, como panelas, pratos, potes, “purrões”, moringas, tachos, entre outras; logo ao lado a feira de pássaros e gaiolas; depois vinha a parte de galinhas e demais aves, além de um pequeno setor que vendia ovos.
A parte seguinte se situavam as “ganhadeiras” que hoje se aperfeiçoou e leva o nome de barraqueiras; como atualmente, elas vendiam frutas e verduras, o “rosário” de Ouricuri, xangó, etc.; mais ao fundo, onde hoje se encontra o abrigo na Praça da Bandeira, ficava a feira dos grossistas que vendiam em sacos de 60 quilos, milho, feijão, farinha e cereais e, geral. Uma coisa peculiar da região é a divisão da unidade de um saco de farinha. Um saco de farinha era dividido em 4 quartas, 8 meia quartas e 16 pratos, cuja divisão equivalia a 80, 40, 20, 10 e 5 litros respectivamente. Finalmente ali se vendia desde as sandálias “salga-bunda”, até preás e cágados.
Em 1914 com a construção do mercado (hoje Mercado de Arte), a parte da frente ficou para os “marchantes” (açougueiros), com divisões e boa higiene. Na outra parte abrigava barracas de cereais no varejo, “bancas de miudezas” onde se vendiam desde sapatos até agulhas e brinquedos. Também existiam os funileiros que vendiam bicas, canecos, candeeiros, etc. Atrás tinha o mercado do fato onde as “fateiras” vendiam os miúdos do boi: rabada, mocotó, tripas, bucho, etc.
A parte da feira-livre, que terminava na Rua Marechal Deodoro até entre o atual “Abrigo” e a Rua Cons. Franco. Na década de 30 do século passado, se situava o ponto de estacionamento para poucos carros e muitos animais de montaria e de carga. O abrigo que foi a primeira Rodoviária de Feira, marcava o final da feira e começava o estacionamento para carros e animais. É oportuno lembrar que existiam casas que faziam do quintal um estacionamento, com mourões separados para estacionamento de animais inteiros, castrados, éguas, burros e jegues; tudo organizado com porteiro e zelador; o primeiro cobrava e o segundo cuidava para que os animais não brigassem.
A feira-livre, com destaque para as “Ganhadeiras” que expunham suas mercadorias no solo forrado com esteira ou pano de saco, então com improvisações de barracas. Na verdade, a feira-livre, junto com a feira do gado, era o sustentáculo do comércio, e este, a base da economia da antiga Feira de Santana.
A Igreja Senhor dos Passos
A Igreja Senhor dos Passos merece bem mais do que um simples resumo, dada a sua longa e bela história. Aliás, vou transcrever o seu início, constante na página da Arquidiocese de Feira de Santana na internet: “Em 1852, o Coronel Felipe Pedreira de Cerqueira concluiu uma Capela com a invocação de Senhor dos Passos, que, pela sua grande devoção, fez erigir, às suas custas, um Templo que fazia conjunto com o casarão onde morava e um cemitério”.
Em outro trecho diz: “Em 1917, a antiga Capela se encontrava em ruínas” e também informe que o bloco da “Casa, cemitério e capela foram demolidos, para que fosse construída a aual Prefeitura”. Em troca a Prefeitura doou o terreno onde se edificou a atual Igreja Senhor dos Passos. Recordo-me que meu pai Gastão Guimarães, contou-nos que no lançamento da Pedra Fundamental, ele, que fora orador do ato, também enterrou uma garrafa, com uma mensagem dentro, devidamente lacrada.
É importante lembrarmos que a Rua Senhor dos Passos ficava onde estava a primeira Capela, sendo a rua principal do comércio, escritórios de advogados, médicos, fotógrafos e outros profissionais que para aqui se deslocavam nos dias da feira-livre, como consta nos jornais da época, ora presentes no belo trabalho de Carlos Brito e Arcênio Oliveira, com o título de MEMÓRIAS (Periódicos Feirenses 1877/1888).